''Desde que o termo surgiu, em 1801, ele foi usado de formas variadas por diferentes pensadores. Deixaremos no entanto de discuti-las aqui, limitando-nos a esclarecer, embora rápida e grosseiramente, o significado dado ao termo por Karl Marx, que será o usado por nós nesse livro.*
Marilena Chauí analisa muito bem a questão no seu livro O que é ideologia? (São Paulo, Brasiliense, 1984, n.13, coleção Primeiros Passos). Ela diz mais ou menos o seguinte:
Para Marx as ideias dominantes em uma sociedade nascem das condições materiais de produção, da existência e das relações sociais por elas geradas em determinado momento histórico. As ideias estão, pois, ligadas à maneira como são apropriados os bens, como é organizado o trabalho, estruturadas as divisões sociais etc, mudando quando também mudam essas condições.
As sociedades de classe se caracterizam por se estruturarem na exploração do trabalho de uns por outros que detém a propriedade dos meios de produção. Isso significa que a maioria deve desempenhar as tarefas mais pesadas, menos prazerosas e pouco recompensadoras, para que a minoria, proprietária, possa ter suas necessidades mais amplamente satisfeitas e seus poderes e privilégios assegurados.
Mas como podem se manter por longo tempo essas sociedades que beneficiam a tão poucos à custa da exploração de muitos?
Nessas sociedades a ideologia aparece justamente como o conjunto de ideias, valores, regras e sentimentos que tem por objetivo justificar como racional, natural ou normal as diferenças sociais, políticas ou culturais, tornando-as mais aceitáveis e ocultando sua verdadeira causa - a luta de classes.
A ideologia nasce da classe dominante mas é assumida pelas demais, dando aos membros de cada sociedade certa coesão e sentimento de identidade. Isso é possível porque, entre outras coisas, os elementos ideológicos aparecem como valores humanos universais e não como valores de uma classe em particular, mesmo porque seus objetivos são exatamente minimizar as diferenças sociais e ocultar a dominação.
A ideologia tem como função exatamente levar os membros de cada sociedade a se conformarem, sem críticas e revoltas, com a sua organização, que é apresentada como a única possível e desejável, sendo cada um o que é por ter se esforçado, por ter escolhido, ou por dispor de talento ou não para ocupar determinadas funções.
A ideologia é portanto um ocultamente e não uma revelação da realidade. Justificando e legitimando a divisão de classes, funciona como instrumento de dominação.
Ao contrário, porém, do que pode parecer, ela não é uma construção consciente, uma invenção ou falsificação voluntária da realidade por parte de seus dominantes. Na verdade ela é a visão que a classe dominante tem do seu modo de existência e da realidade, conforme suas próprias experiências e condições.
A ideologia é, pois, um fato social produzido pelas relações sociais em um determinado momento histórico, independente do desejo ou de 'maquinações cerebrais' da classe que tem o poder.''
*A invasão cultural norte-americana
Nenhum comentário:
Postar um comentário