quinta-feira, 20 de julho de 2017

Marx e a categoria de ''capital humano''




''A capacidade de trabalho foi denominada capital do trabalhador na medida em que ela é o fundo que o trabalhador não exaure em uma troca isolada, mas pode repeti-la continuamente durante sua vida como trabalhador. De acordo com essa concepção, seria capital tudo que fosse um fundo de processos reiterados de um mesmo sujeito; assim, p. ex.: a substância dos olhos seria o capital da visão etc. Semelhantes lugares-comuns beletristas, que classificam tudo sob tudo por meio de qualquer analogia, podem até parecer inteligentes ao serem ditos pela primeira vez, e tanto mais quanto mais identificam as coisas mais disparatadas. Repetidos, sobretudo com autocomplacência, como máximas de valor científico, são pura e simplesmente tolos. Bons apenas para paroleiros letrados e charlatães, que lambuzam todas as ciências com suas imundícies meladas. Que o trabalho é sempre nova fonte da troca para o trabalhador enquanto ele está capacitado para o trabalho – mais precisamente, não da troca pura e simples, mas da troca com o capital – está implícito na própria determinação conceitual de que o trabalhador só vende a disposição temporária sobre sua capacidade de trabalho, que ele sempre pode, portanto, reiniciar a troca tão logo tenha ingerido a quantidade suficiente de matéria para poder reproduzir de novo sua expressão vital. Em lugar de dirigir seu assombro para tal ponto – e debitar ao trabalhador, como um grande mérito do capital, o fato de que ele enfim vive, que pode, portanto, repetir diariamente determinados processos vitais tão logo tenha descansado e se alimentado –, os sicofantas da economia burguesa, que douram as coisas, deveriam antes ter dirigido sua atenção para o fato de que o trabalhador, após o trabalho repetido de forma contínua, somente dispõe de seu trabalho vivo, imediato, para trocar. A própria repetição é, de fato, só aparente. O que ele troca com o capital é toda a sua capacidade de trabalho, que ele despende, digamos, em vinte anos. Em lugar de pagá-la de uma só vez, o capital a paga em doses, digamos, semanalmente, à medida que o trabalhador a coloca à sua disposição. Portanto, isso não altera em absoluto a natureza da coisa e menos ainda autoriza a conclusão de que, porque o trabalhador precisa dormir entre 10 e 12 horas para ser capaz de repetir seu trabalho e sua troca com o capital, o trabalho constitui seu capital. Por conseguinte, o que é assim compreendido como capital é, de fato, o limite, a interrupção de seu trabalho, o fato de que ele não é um perpetuum mobile. A luta pela Lei das Dez Horas etc. é a prova de que o capitalista nada mais deseja senão que o trabalhador dilapide suas doses de força vital tanto quanto possível sem interrupção.''

- Karl Marx, Esboços da crítica da economia política: III. Capítulo do capital: Primeira seção: o processo de produção do capital. Capítulo do dinheiro como capital: 2) O valor de troca emergindo da circulação, pressupondo-se à circulação, conservando-se e multiplicando-se nela pela mediação do trabalho

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