Artigo de Michael Roberts para seu blog, The Next Recession; tradução do site resistir.info
O anúncio de Mário Draghi na reunião do conselho de administração de 22/Janeiro do Banco Central Europeu (BCE) de que este e os bancos centrais nacionais da zona Euro injetariam €1,1 milhão de milhões de crédito novo ao longo dos próximos 18 meses nos bancos da área certamente teve um resultado rápido. O Euro caiu numa queda de onze anos contra o dólar estadunidense.
O BCE finalmente aderiu ao Federal Reserve, ao Banco da Inglaterra e ao Banco do Japão naquilo que é chamado sem rodeios como facilidade quantitativa (quantitative easing, QE). Isto é, a compra direta pelos bancos centrais de títulos de governos, corporações e imobiliários pagos por meio de "impressão de dinheiro", ou mais precisamente criando eletronicamente reservas de dinheiro em bancos.
Até agora, o BCE evitara fazer esta QE e, ao invés, meramente emprestava dinheiro ou crédito aos bancos por períodos de tempo cada vez maiores (agora de até três anos) a taxas de juro virtualmente de zero. O governo alemão e os da Europa do Norte opunham-se à compra de títulos da Irlanda, Espanha, Portugal, Itália e Grécia, os governos perdulários. Eles temiam que tais compras permitissem a estes governos gastarem como quisessem e colocarem em risco o contribuinte alemão em decorrência de quaisquer incumprimentos sobre esta dívida.
Mas tamanha tem sido a estagnação da maior parte das economias da zona Euro e a perspectiva crescente de deflação absoluta que os alemães, holandeses e finlandeses foram persuadidos, a patear e a gritar, a que o BCE deve arriscar e comprar títulos italianos e espanhóis detidos por bancos, companhias de seguros, fundos de pensões e hedge funds e esperam que isto ajude a por em movimento a economia da zona Euro e evitar a deflação.
Como expliquei na minha mensagem anterior ( https://thenextrecession.wordpress.com/2015/01/11/the-spectre-of-deflation/ ) e também agora num artigo para o Weekly Worker desta semana ( http://www.weeklyworker.co.uk/worker/1042/the-spectre-of-deflation/ ), há o espectro da deflação a pairar sobre a Europa, o qual poderia arrastar toda a região a uma depressão profunda e a uma euro crise renovada. Assim, esta ação era necessária.
Para os dubitativos São Tomés alemães houve uma folha de parreira: que 80% do suposto risco das novas compras de dívidas governamentais seria remetida a bancos centrais nacionais e não partilhada pelo Eurosistema. Mas isso é uma ilusão: se qualquer banco central nacional entrar em perturbação devido a perdas com a compra dos títulos do seu próprio governo, o BCE teria de salvá-los de qualquer forma.
Assim, a pergunta real é: será que esta enorme QE levantará a economia da zona Euro da sua depressão quase deflacionária? Bem, ela certamente está a conduzir Euro para baixo. Isso ajudará exportadores da zona Euro a competirem nos mercados mundiais contra os da Suíça, EUA e alguns produtores asiáticos. Mas como a maior parte das exportações de cada estado membro da União Monetária Europeia (UME) são diferentes uns dos outros, um euro mais fraco não será suficiente para fazer com que as coisas andem.
A menos que os salários reais (os quais têm estado a cair na maior parte das economias da zona Euro) e o investimento em negócios (os quais permanecem estagnados na maior parte das economia da zona Euro) comecem a subir, não haverá escapatória à estagnação e à depressão. E a QE não fará isso, como expliquei com mais pormenor numa mensagem anterior ( http://thenextrecession.wordpress.com/2014/11/02/the-story-of-qe-and-the-recovery/ ). Desde a utilização do QE a partir de 2010 por vários bancos centrais, o crescimento global tem permanecido fraco e com tendência baixa e a recuperação no emprego e no investimento tem sido fraca apesar de uma enorme impressora eletrônica de dinheiro. O crescimento econômico real não tem correspondido.
A QE não funcionou para elevar as taxas de crescimento econômico de volta aos níveis anteriores à crise. Assim, para onde tem ido todo o dinheiro? Ele tem ido para dentro do sistema bancário para escorar seus balanços e restaurar seus lucros. E isto engendrou uma bolha maciça em ativos financeiros; e os preços de títulos do governo e corporativos e, acima de tudo, de ações, tem-se elevado a alturas recorde.
Os únicos beneficiários têm sido os 1% de topo dos detentores de riqueza que por toda a parte possuem o grosso dos ativos financeiros.
Quão errado podia estar? O objectivo do BoJ de uma taxa de inflação de 2% permanece uma quimera cerca de quatro anos depois, enquanto a economia real do Japão paira perto da recessão apesar de um programa QE que representou uma ascensão nos haveres de títulos do governo equivalente a 50% do PIB e em crescimento. ( http://thenextrecession.wordpress.com/2014/10/13/japan-the-failure-of-abenomics/). Haverá o mesmo resultado para o programa QE do BCE: o Euro pode cair, como aconteceu com o yen depois de o BoJ iniciar o seu programa. Mas não haverá recuperação significativa do crescimento econômico.
Na verdade, longe de procurar um aumento da QE ou da despesa do governo, o Fed dos EUA prepara-se para aumentar sua "política de taxa" no fim deste ano. E o risco é de que se o Fed implementar um aumento das taxas de juro em 2015, então o boom financeiro também entrará em colapso e os lucros começarão a cair, aumentando o risco de um novo declínio (slump) (ver, thenextrecession.wordpress.com/…/…/the-risk-of-another-1937/ ).
A OCDE apoia a política atual da QE e fala de gastos em investimento. "Com o lançamento das "três setas" do Japão em 2013, o recente lançamento da UE de um plano de investimento e o esperado movimento da área Euro em direção à facilidade quantitativa, a probabilidade de escapar à armadilha da estagnação está a aumentar". Mas não será suficiente: "é necessária nova ação para sustentar este momento de reforma positiva".
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