domingo, 11 de outubro de 2015

Marx sobre aumento de salários e inflação





''Mas alega-se que o maior dispêndio de capital-dinheiro variável (supõe-se, naturalmente, que não varia o valor do dinheiro) significa maior massa de recursos monetários nas mãos do trabalhador, decorrendo daí maior procura de mercadorias pelos trabalhadores e, por conseguinte, elevação nos preços das mercadorias. Ou alega-se: se sobem os salários, os capitalistas elevam os preços das mercadorias. -- Nos dois casos, alta geral dos salários causa subida nos preços das mercadorias. Por isso, para fazer circular as mercadorias é necessária maior massa de dinheiro, explique-se a elevação dos preços de um modo ou outro.

 Resposta à primeira asserção: com a elevação dos salários, os trabalhadores aumentam sobretudo a procura de meios de subsistência necessários. Em menor grau aumentará sua procura de artigos de luxo ou de artigos que antes não estavam na sua área de consumo. A súbita procura mais ampla dos meios de subsistência necessários fará subir absoluta e momentaneamente os preços. Consequência: aumenta a parte do capital social aplicada na produção dos meios de subsistência necessários e diminui a empregada na produção de artigos de luxo, uma vez que os preços destes caem em virtude de reduzir-se a mais-valia e, portanto, a procura deles pelos capitalistas. Na medida em que os trabalhadores fazem compras de artigos de luxo, a elevação de seus salários, até o montante dessas compras, não tem qualquer efeito no sentido de elevar os preços de subsistência necessários, mudando apenas os compradores de artigos de luxo. No tocante a esses artigos, quantidade maior passa a entrar no consumo dos trabalhadores e quantidade relativamente menor no consumo dos capitalistas. Eis tudo. Depois de algumas oscilações, circula massa de mercadorias que tem o mesmo valor de antes. Quanto às oscilações momentâneas, não terão elas outro efeito que o de lançar na circulação interna capital-dinheiro desocupado que até então procurava aplicação nas especulações de bolsa ou no estrangeiro.

 Resposta à segunda asserção: se estivesse nas mãos dos produtores capitalistas elevar a seu bel-prazer os preços das mercadorias, teriam eles poder para fazê-lo e fazê-lo-iam mesmo sem subirem os salários. Os salários nunca subiriam ao caírem os preços das mercadorias. A classe capitalista nunca se oporia aos sindicatos, pois poderia sempre e em qualquer circunstância fazer o que na realidade faz atualmente em caráter excepcional, em circunstâncias determinadas, especiais, por assim dizer locais, a saber, utilizar-se de qualquer elevação de salários a fim de aumentar em proporção bem maior os preços das mercadorias e assim embolsar maiores lucros.

 Afirmar que os capitalistas podem elevar os preços dos artigos de luxo, por diminuir a correspondente procura (em virtude de reduzir-se a procura dos capitalistas, decrescem os meios de compra de que dispõem para esses artigos) seria aplicação extremamente original da lei da oferta e da procura. Enquanto os compradores que saem do mercado não são compensados por compradores que entram, enquanto os trabalhadores não substituem os capitalistas, caem os preços dos artigos de luxo em virtude da redução da procura: e, na medida em que ocorre essa substituição, a procura dos trabalhadores não concorre para elevar os preços dos meios de subsistência necessários, pois os trabalhadores não podem despender em meios de subsistência necessários a parte do acréscimo de salário que gastam em artigos de luxo. Em consequência, retira-se o capital da produção desses artigos até que a oferta se reduza a um nível correspondente ao diferente papel que eles passam a ter no processo social de produção. Com a produção diminuída, esses artigos voltam a ter seus preços normais, desde que não haja alterações no valor. Enquanto se dá essa contração ou esse processo de compensação, aflui para a produção dos meios de subsistência, com a elevação de seus preços, tanto capital quanto perde o outro setor de produção, até que a procura fique saturada. Restabelece-se então o equilíbrio, e o resultado final de todo o processo é o capital social, inclusive naturalmente o capital-dinheiro, repartir-se então em proporção diferente entre a produção dos meios de subsistência necessários e a dos artigos de luxo.

 Todas as objeções dos capitalistas e de seus sicofantas econômicos não passam de intimidação.''

MARX, Karl. O capital: crítica da economia política: livro II. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2014, pp. 384-6.

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