sábado, 4 de abril de 2015

A ditadura de Pinochet não fez do Chile um ''paraíso neoliberal''


 Artigo do site ''Desmentindo reacionários'', criado pelo(s) administrador(es) da página ''Meu Professor de História''.


 Os reacionários adoram citar o Chile como exemplo de sucesso de políticas neoliberais na América Latina. Sempre tentam usar esse argumento para minimizar as gravíssimas, massivas e sistemáticas violações dos direitos humanos cometidas pelos agentes da ditadura comandada por Augusto Pinochet, com apoio externo dos Estados Unidos e Brasil (na época também sob ditadura de uma Junta Militar), e apoio interno da ínfima minoria de chilenos economicamente privilegiados.

 De fato, a violação dos direitos humanos foi uma política de Estado sob o regime autocrático de Augusto Pinochet. Nos meses seguintes ao golpe, as Forças Armadas e Polícia criaram campos de concentração para prisioneiros políticos e agiram como exército de ocupação nas ruas das cidades chilenas, sitiando especialmente os bairros operários, principal base social da Unidade Popular e de Salvador Allende. Após suprimir a resistência antigolpista por meio da tortura e extermínio, os agentes da ditadura cometeram muitas outras violações no combate à guerrilha urbana, movimentos de greve e protestos de rua.


 Militares e policiais à serviço dos golpistas cometeram graves, massivas e sistemáticas violações de direitos humanos: prisões arbitrárias, estupro, tortura, assassinato e desaparecimentos forçados. Ao mesmo tempo, a política econômica assessorada por Milton Friedman e seus discípulos impunha a desregulamentação e privatização de mercados e serviços públicos.

 As estimativas de vítimas da repressão política variam, mas podemos listar: a) entre 3.200 e 30.000 assassinatos/desaparecimentos politicamente motivados; b) entre 40.000 e 200.000 sobreviventes da tortura politicamente motivada; c) centenas de milhares detidos sob suspeita de serem dissidentes políticos; d) 200.000 exilados por motivação política. Esses dados não incluem a criminalidade violenta sem motivação política.

Um dos legados da ditadura de Pinochet.

 Não satisfeita na violência política interna, a Junta Militar chilena cooperou com suas homólogas brasileira, argentina, uruguaia, paraguaia e boliviana para sequestrar, torturar e exterminar opositores, inclusive exilados na Europa e Estados Unidos. Essa cooperação militar repressiva ficou conhecida como “Operação Condor”, embora datasse de antes do acordo secreto do Plano Condor de 1975. Os neoliberais afirmam que, apesar deste Terrorismo de Estado, a ditadura neoliberal-militar conseguiu bons resultados econômicos e sociais. Será?

 Podemos começar por um dado interessante: centenas de milhares de pessoas deixaram o Chile durante o governo de Pinochet, das quais 200 mil fugiam da perseguição política. E o restante? Fugiram da pobreza e desemprego em alta e direitos trabalhistas em baixa durante o período ditatorial.

 Como podemos observar abaixo, durante este período o desemprego aberto no Chile se manteve muito acima da média sul-americana, variando entre um máximo de 20% e pouco menos de 10%.




 No gráfico abaixo podemos verificar a incidência de pobreza extrema urbana em três países sul-americanos. Chile e Brasil seguem uma trajetória semelhante na redução gradual dessa miséria urbana em duas décadas. No caso chileno, a redução da pobreza coincide com o fim da ditadura pinochetista. Estas tendências provavelmente são devidas a programas sociais promovidos pelos governos eleitos.




 A tabela abaixo mostra a gradual redução da pobreza extrema depois do fim da ditadura de Pinochet. Observe que a miséria atingia quase metade de população residente no Chile nos últimos anos da ditadura.  Comparando com os gráficos anteriores, é possível inferir que a pobreza extrema pode ter sido muito maior no período de maior desemprego, entre 1982-86. Mais uma vez, é provável que a redução da pobreza extrema tenha sido resultado de uma política social progressista, implantada pelos governantes eleitos e pressão de movimentos populares que adquirem maior margem de manobra quando há um mínimo de direitos civis e políticos garantidos.





 No gráfico abaixo podemos observar a evolução da inflação e desemprego entre 1960 e 2007. Reparem que a inflação só fica abaixo de 10% a partir de 1994, quatro anos após o fim da ditadura pinochetista. O período de máxima inflação se dá entre 1972 e 1978, mas o fenômeno da alta inflação era anterior, com picos e quedas, sempre com dois dígitos, sem esquecer, ainda, que o governo da UP/Allende sofreu campanhas de sabotagem econômica, como o açambarcamento (prática de esconder mercadorias para forçar o aumento do preço) e greves patronais que confluíram para provocar crises de escassez e inflação. Em compensação, a política de emprego foi um verdadeiro sucesso, com a vigência do pleno emprego durante a presidência de Allende. Após o golpe, porém, à medida que a liberalização econômica era aplicada, o desemprego aumentava, ultrapassando os 20% em 1983, quase empatado com a inflação que se aproximava dos 25%. De 1975 a 1987, o desemprego não ficou abaixo dos 10%.

 


 Abaixo podemos observar a evolução da desigualdade de renda individual, medida pelo índice Gini, no período de 1957-2007. De início, é possível verificar que no governo Allende se inverte a trajetória de aumento da desigualdade de renda, levando ao período mais igualitário, fato que é ainda mais reforçado se recordamos do avanço da reforma agrária (que reduz o índice Gini rural), educação e saúde públicas. Depois do golpe (setembro de 1973), com a imposição de medidas neoliberais, a tendência à redução da desigualdade é invertida, resultando no auge da desigualdade de renda nos últimos anos do regime ditatorial. A partir dos anos 1990 a desigualdade tem uma redução brusca, e em seguida um aumento gradual. Esse aumento da desigualdade de renda no período ditatorial pode ser considerado ainda mais grave, se levarmos em conta a reversão da reforma agrária e a privatização de serviços públicos, como a educação e previdência. Como apenas o serviço público pode garantir o acesso igualitário a vários produtos (educação, saúde, previdência, eletricidade, água, esgoto, transporte, telefonia…), é de se supôr que a privatização e desregulamentação deixou operários e camponeses ainda mais desamparados.

 

 Até mesmo em relação à renda nacional a política econômica da ditadura não parece ter sido favorável. O Chile tinha uma renda média por habitante um pouco acima da média latino-americana. A partir da campanha de sabotagem econômica patrocinada pelos EUA e burguesia chilena, a renda cai no final do governo Allende, e só recupera a sua posição acima da média latino-americana depois do fim da ditadura de Pinochet. Com uma diferença fundamental: enquanto Allende sofreu sabotagem, Pinochet beneficiou-se de auxílio e apoio da burguesia interna e externa, através do governo dos EUA, colaboração e investimentos externos diretos. Mesmo assim, apenas no pós-ditadura houve recuperação da antiga posição.

 

 Para concluir, o que esses dados mostram é que o governo da UP/Allende foi capaz de garantir a redução da desigualdade e o pleno emprego, enquanto as medidas liberalizantes da ditadura tiveram como resultado o aumento da desigualdade, desemprego e miséria, com resultados muito fracos no controle da inflação. A inflação já tinha viés de alta antes de Allende, alcançando os 50% anuais entre 1972 e 1978, ou seja, final do governo Allende e início do governo Pinochet, mas só ficou abaixo de 10% depois do fim da ditadura.


 O desemprego, miséria, desigualdade, inflação e renda média por habitante tiveram melhora sensível a partir dos governos eleitos, e, mesmo assim, apenas a inflação e a renda média podem ser considerados satisfatórios. Essa melhoria de indicadores de emprego e distribuição de renda pode ser explicada:

a) por uma parcial reformulação da política econômica neoliberal nos últimos anos da própria ditadura de Pinochet (não esqueçamos que o Chile foi um laboratório…);

b) por políticas sociais implantadas pelos governos da Concertación (coalizão entre socialistas e social-democratas), que, no entanto, mantiveram vários princípios neoliberais que são ainda motivo de insatisfação e revolta na juventude chilena;

c) conjuntura internacional favorável, com o aumento do preço do cobre, principal produto de exportação chileno, no mercado mundial.
Favela chilena.

 Sendo assim, a dependência da economia chilena em relação aos preços internacionais co cobre é um calcanhar de Aquiles. Mas mesmo sob conjuntura externa favorável, a política neoliberal chilena, apesar de todas as correções e ajustes ao longo de 40 anos, contribuiu apenas para aprofundar os graves problemas de exclusão social do Chile. As grandes mobilizações da juventude chilena, apesar da forte repressão policial, estão aí para mostrar que há problemas neste “paraíso”.


quinta-feira, 2 de abril de 2015

A globalização, o neoliberalismo e a síndrome da imunidade autoatribuída


Artigo do falecido professor Reinaldo Carcanholo, professor do Mestrado e do Departamento de Economia da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), doutor em Economia, UNAM, México, publicado no livro ''Neoliberalismo: a tragédia do nosso tempo'' (São Paulo, Cortez, 2002).


O falecido professor Reinaldo.



''Querem nos impor uma nova mentira como verdade histórica: a mentira da derrota da esperança, a mentira da derrota da dignidade, a mentira da derrota da humanidade.'' - Subcomandante Marcos, do EZLN*

 Atualmente a propaganda oficial e os grandes meios de comunicação  (escritos, televisivos etc.) fazem-nos acreditar que a política neoliberal e o rápido e aparentemente inexorável processo de globalização da economia, além de inevitáveis, respondem à razão e às leis naturais.

 Assim, por exemplo, podemos ler em um editorial de prestigioso jornal brasileiro:

O novo presidente da UNE (...) entre outros arroubos juvenis proclama que sua bandeira será o combate ao 'projeto neoliberal' do governo Fernando Henrique. É a UNE contra o mundo. [1]

E conclui o editorial:

A nova UNE foi reprovada por suas velhas ideias [2].

 Dessa maneira, segundo o jornal, não há alternativa. Se a UNE, qualquer outra instituição ou qualquer pessoa, está contra o neoliberalismo, está contra o mundo inteiro. Não cabe a menor possibilidade de discussão.

 É verdade que, por trás do exagero e da irracionalidade da afirmação [3], está, sem dúvida, a manifestação descarada de uma precoce campanha eleitoral para que o governo de turno, com seu programa de caráter obviamente neoliberal, logre a reeleição. No entanto, isso também faz parte de um movimento muito maior, que transcende as fronteiras de uma nação, e que procura apresentar o neoliberalismo como única concepção aceitável sobre a sociedade nos dias de hoje (o ''pensamento único'', na feliz expressão de Ignacio Ramonet [4]) e a globalização como único caminho que leva ao progresso e à modernidade, ao paraíso e à plena realização da natureza humana.

 Assim, a globalização, além de processo inevitável ao qual todos os países e regiões do mundo estariam subordinados, seria o melhor caminho (na verdade o único) para o desenvolvimento, para superar as misérias e o atraso. A resistência e a oposição que se manifestarem a ela só poderiam atrasar o ingresso do país nessa trajetória ao progresso, ao desenvolvimento pleno das potencialidades econômicas da nação. A globalização, ao efetivar-se, permitiria superar os males do capitalismo primitivo, atrasado. Entre eles, manifestações tão bárbaras como a exploração insuportável de crianças da mais tenra idade, tal como aparece denunciado, por exemplo, por Marx, em O Capital, e em outras partes.

 De fato, o capitalismo pode ter sido responsável por misérias e violências inaceitáveis, mas isso teria sido próprio de um sistema que procurava abrir-se passo na história. Por maiores que tenham sido seus excessos e seus rigores, hoje podemos olhar para trás e, se não perdoar, notar que foi o preço necessário para que se alcançasse a sociedade capaz de realizar plenamente a natureza humana. Sem dúvida, essa é uma forma pela qual muitos podem interpretar a história das misérias humanas nos últimos 2 ou 3 séculos.

 Continuemos dentro dessa perspectiva. É possível admitir que essas misérias e violências, observáveis nos primórdios do capitalismo, sobreviviam em algumas partes do mundo, mas é possível acreditar que isso ocorre somente como sintoma do atraso, da falta de capitalismo de mercado e não o contrário. A resistência à globalização e ao neoliberalismo seria a responsável pela sobrevivência dessas manifestações extremas, próprias da fase inicial do capitalismo. É dessa maneira que as coisas são concebidas pela ideologia neoliberal.

  Ironicamente, a ideia de Marx de que ainda vivemos na pré-história da humanidade é aqui retomada, só que de um ponto de vista totalmente antagônico, reacionário. Para esse autor, enquanto sobrevivam as classes sociais, a exploração, a extorsão do excedente econômico, a humanidade vive sua pré-história. Só com a superação dos antagonismos de classe, com a superação da sociedade que estimula até o infinito as necessidades materiais dos indivíduos e com o surgimento de uma sociedade em que desaparece a necessidade econômica insatisfeita (até porque limitada), surge a história da Humanidade. Por outro lado, para a perspectiva neoliberal, a pré-história termina com o domínio total do mercado e do capitalismo sobre todas as partes do mundo; a história se inicia com a vitória do capital sobre tudo e sobre todos.

 Mas vejamos alguns exemplos de excessos e misérias próprios do capitalismo em sua fase atrasada. Observemos algumas das denúncias transmitidas por Marx, a partir de informações [5] sobre a situação inglesa, durante o século XIX, especialmente em seus dois primeiros terços:

Em começo de junho de 1836, foram encaminhadas denúncias aos magistrados de Dewbury (Yorkshire) relativas à violação da lei fabril por proprietários de 8 grandes fábricas (...) Alguns desses cavalheiros eram acusados de ter posto a trabalhar 5 meninos, de 12 a 15 anos, de 5 horas da manhã de sexta-feira até às 4 da tarde do sábado seguinte, sem lhes conceder nenhum descanso, além do tempo das refeições e 1 hora para dormir à meia-noite. E esses meninos tiveram de realizar essas 30 horas de trabalho permanecendo na verdadeira caverna onde são desmanchados os trapos de lã e onde nuvens de poeira de resíduos forçam mesmo o trabalhador adulto a tapar continuamente sua boca com o lenço, a fim de proteger os pulmões. Os cavalheiros acusados afirmam (...) que tinham com sua grande compaixão permitido aos miseráveis meninos dormir 4 horas, mas os obstinados não queriam de modo algum ir para a cama [6].

 Destaque-se que a ideia neoliberal é a de que a globalização, ao permitir, especialmente para o Terceiro Mundo, a superação da fase mais selvagem do capitalismo, e ao tornar possível o progresso e o desenvolvimento, tornaria obsoleta a crítica humanista de Marx aos rigores do capital ilustrados por essa passagem e também pela seguinte:

 O juiz do condado Broughton (...) declarou que naquela parte da população, empregada nas fábricas de renda da cidade, reinavam sofrimentos e privações em grau desconhecido no resto do mundo civilizado (...) Às 2, 3 e 4 horas da manhã, crianças de 9 e 10 anos são arrancadas de camas imundas e obrigadas a trabalhar até às 10, 11 ou 12 horas da noite, para ganhar o indispensável à mera subsistência. Com isso seus membros definham, sua estatura se atrofia, suas faces se tornam lívidas, seu ser mergulha num torpor pétreo, horripilante de se contemplar [7].

 Talvez até mais impressionante que isso fosse a situação na fabricação inglesa de fósforo de atrito, no final da primeira metade do século XIX:


A metade dos trabalhadores são meninos com menos de 13 anos e adolescentes com menos de 18 anos. Essa indústria é tão insalubre, repugnante e mal afamada que somente a parte mais miserável da classe trabalhadora, viúvas famintas etc., cede-lhes seus filhos, ''crianças esfarrapadas, subnutridas, sem nunca terem frequentado escola'' [8].

 E Marx conclui, no mesmo parágrafo:

 O dia de trabalho, ali, variava entre 12, 14 e 15 horas, com trabalho noturno, refeições irregulares, em regra no próprio local de trabalho, empesteado pelo fósforo. Dante acharia ultrapassadas nessa indústria suas mais cruéis fantasias infernais [9].

 Haverá testemunho de situação mais terrível e miserável? Prestemos atenção a só mais uma passagem:

Encontramos adolescentes a partir de 12 anos trabalhando mais de um turno (limite autorizado pela lei), sem registro legal, em locais insalubres, expostos a até 20 horas diárias ao trabalho e ao cheiro tóxico das colas de sapateiro. Não tinham nenhuma proteção e a constante exposição pode transformá-los em viciados. A remuneração era tão baixa (de $0,45 a $0,75 por hora) que se obrigavam a trabalhar a até 20 horas.

 Assim, entendido o neoliberalismo como a concepção capaz de superar as mazelas do atraso e permitir, mais rapidamente, alcançar as vantagens da globalização, o progresso e  modernidade, tais manifestações extremas de exploração e miséria seriam superáveis.

 Mas olhe-se um pouco mais atentamente a última citação. Fala-se ali em jornadas de até vinte horas de trabalho para meninos a partir de 12 anos de idade! Note-se, também, que, à diferença das citações anteriores, não foi informada sua fonte. E isso se fez intencionalmente. Mais do que isso, algumas das  palavras foram deliberadamente substituídas, por nós, para que o leitor fosse induzido ao erro. Não se trata da Inglaterra do século XIX. Veja-se novamente a mesma citação, agora literalmente transcrita, tal qual aparece em sua fonte original:

Encontramos adolescentes a partir de 12 anos trabalhando mais de um turno (limite autorizado pela CLT), sem carteira assinada, em locais insalubres, expostos a até 20 horas diárias de trabalho e ao cheiro tóxico das colas de sapateiro. Não tinham nenhuma proteção e a constante exposição pode transformá-lo em viciados. A remuneração era tão baixa (de R$0,45 a R$0,75 por hora) que se obrigavam a trabalhar a até 10 horas.

 Deliberadamente havíamos substituído a sigla CLT pela palavra lei, a expressão ''sem carteira assinada'' por ''sem registro legal'' e o símbolo do Real (R$), moeda brasileira atual, pelo símbolo mais genérico ''$''. Tudo isso para que não houvesse suspeita de que se referia a uma situação observada no Brasil, nos dias de hoje!

 De fato, trata-se de uma declaração, publicada pelo Jornal do Brasil, de 7.7.1997, sob o título ''A exploração do trabalho infantil no Sul'', de uma senadora da República Brasileira que preside a Comissão Parlamentar de Inquérito do Congresso Nacional, com base em caso recente, constatado numa empresa de fabricação de sapatos na cidade de Sapiranga (Vale dos Sinos -- RS). Não se trata da Inglaterra do século passado, mas do Brasil atual; não se trata de uma atividade atrasada pré-capitalista, mas de uma indústria capitalista atual. Não é o fruto do atraso, mas justamente consequência da política neoliberal aplicada no Brasil nos últimos governos, tendo como objetivo a rápida inserção da economia brasileira na globalização econômica, como poderemos ver posteriormente.

A síndrome da imunidade auto-atribuída


 Obviamente que os neoliberais não concordarão com a afirmativa de que tais consequências externas resultem das políticas que implementaram no Brasil nos últimos quase dez anos. Ao contrário, para eles, se de fato esses extremos ocorrem, só podem ser o resultado do atraso, das políticas populistas anteriores, da ausência de uma prática liberalizante na medida adequada; tal situação só pode ser consequência de um Estado interventor ainda enorme, ineficiente e deformador. Se, durante esse tempo, medidas liberais foram adotadas, não o foram na magnitude certa, no volume adequado, na profundidade exigida. É necessário liberalizar ainda mais, e só então veremos que fatos como esse tenderão progressivamente a desaparecer. Só com o tempo, e depois de medidas liberais profundas, sistemáticas, coerentes, prolongadas, o resultado do progresso e da modernidade será observado.

 É exatamente dessa maneira que o pensamento neoliberal se faz imune a qualquer crítica baseada nos fatos. Qualquer que seja a consequência negativa de suas propostas implementadas, qualquer que seja o resultado nefasto advindo da implementação de um projeto neoliberal, mesmo que coerente, profundo, articulado, sistemático e suficientemente prolongado, sempre resta o argumento de que as medidas liberais não foram suficientemente profundas e prolongadas. E isso, por uma razão muito simples: numa sociedade capitalista, por mais que o mercado tenha se desenvolvido e domine, sempre haverá espaço adicional para a expansão do seu domínio; o mercado sempre pode conquistar dimensões ocupadas pelo não-mercado.

 O neoliberalismo resguarda-se tanto das críticas quanto dos fatos, pois atribui-se imunidade. Padece, com efeito, do que poderíamos chamar de síndrome da imunidade autoatribuída [10]. Na verdade, o que chamamos por esse nome é denominado por César Benjamin ''o mito do moto-perpétuo'', explicado da seguinte maneira:

O terceiro mito é, digamos assim, mais insidioso: é preciso esperar e insistir, dar mais tempo ao tempo, dobrando a aposta quando necessário, pois -- eis aí o verdadeiro problema -- ''o modelo ainda não foi completamente implantado'' [11].

 E, lembrando que ''o caso argentino tornou-se patético'', afirma:

Diante das dificuldades que se avolumam numa grande nação já bastante humilhada, propõe-se uma nova rodada das reformas liberais, argumentando-se -- agora -- ter sido insuficiente extinguir a moeda nacional, desindustrializar o país, levar desemprego a níveis até então impensáveis, privatizar e entregar, quase sempre a multinacionais, além de todas as empresas estatais, o controle do subsolo (inclusive as reservas de petróleo e gás), dos aeroportos, dos portos, das rodovias, do sistema elétrico, dos campos de futebol e tudo o mais [12].

 A explicação que César Benjamin apresenta para a referida síndrome ou mito do moto-perpétuo é perfeita:

...sendo o livre mercado apenas um tipo ideal, incapaz de organizar em torno de si o conjunto da vida social, a implantação do modelo neoliberal, por definição, está sempre incompleta. Cria-se assim um discurso que, como os demais discursos ideológicos, externaliza suas dificuldades e encontra em si mesmo o secreto motor de sua própria reciclagem. Não depende do confronto com uma realidade que lhe seja exterior, pois contém em si as condições suficientes de sua legitimidade [13].

 Assim, o neoliberalismo atribui a si mesmo a imunidade frente às manifestações do real, especialmente quando não lhe são favoráveis do real, especialmente quando não lhe são favoráveis. mais do que isso até, usa a realidade sempre como argumento para sua continuidade:


É certo que os êxitos, quando existem, o fortalecem. Mas, paradoxalmente, os fracassos também, pois ele sempre pode acionar uma fuga para frente: isso e aquilo estão atrapalhando o mercado. Os liberais terão razões para repetir esse argumento ad hominem, pois sempre haverá instituições e práticas informais, que ''atrapalham'' o mercado. Afinal, como enfatiza Karl Polanyi, as sociedades organizadas, para sobreviver, precisam se defender do mercado, mesmo quando o adotam [14].

 Globalização e aumento da exploração do trabalho



 Mas, deixemos de lado a pretensão de imunidade dos neoliberais e voltemos a analisar o caso da indústria de sapatos, no qual se manifesta aquele caso extremo de exploração da força de trabalho infantil. Frente àquela situação, como tentam se explicar os empresários do setor? A busca da resposta a essa pergunta não nos custará muito, pois pode ser encontrada na mesma página do citado jornal [15]. Para evitar maior perda de tempo, tentemos resumir e interpretar as opiniões ali expressadas:

  • o setor calçadista tem enfrentado, há algum tempo, a forte concorrência da produção chinesa (e de alguns outros países) que entram no país como importações pouco gravadas por impostos, fruto da abertura brasileira ao comércio mundial; também enfrenta forte concorrência no mercado internacional para suas exportações;
  • a situação de sobrevalorização cambial, que se mantém há alguns anos no Brasil, contribui ainda mais para as dificuldades desse setor produtivo;
  • desde o início do Plano Real o setor já teria conseguido uma redução média de 10% nos seus custos, mas isso não é considerado suficiente e estariam trabalhando para uma redução adicional de uns 20% [16];
  • quais têm sido os mecanismos utilizados pelos empresários do setor para alcançar essa significativa redução dos custos e dos preços de sapatos produzidos nacionalmente? Na reportagem citada, mencionam-se os seguintes:

    -- as empresas estão buscando relocalizar suas fábricas para estados onde os custos sejam menores e os benefícios fiscais maiores;
    -- renegociação de preços com seus fornecedores, de maneira que os custos com insumos do setor se reduzam;

 A propósito, algumas afirmações dos empresários do setor paralelas ao assunto merecem ser transcritas [17]:

  • ''Mas há o custo Brasil que precisa ser eliminado'' [18];
  • ''a cadeia calçadista está inchada de impostos e juros. As reformas no Congresso são fundamentais'' [19];
  • ''A indústria chinesa gasta US$ 40 por mês com seu sapateiro, e o vietnamita menos de US$ 40. Não dá para competir''.
  Falando sobre a Itália que produz sapatos de melhor qualidade, com preços similares aos do Brasil, outro empresário afirma:

Mas precisamos reduzir custos, como eles: usam a Tunísia para fabricar, enviando o material e os modelos. Depois recebem de volta e colocam o Made in Italy para exportar para os EUA. 

 Analisemos um pouco mais a questão.

 A política neoliberal dos governos brasileiros mais recentes, toda ela, esteve dirigida a permitir uma maior integração do país na lógica econômica internacional, transformando-o num espaço permeável à globalização. Tudo isso no entendimento de que se trata da única via capaz, nos dias de hoje, de conduzir ao progresso e de tornar possível a modernidade. A política de estabilização monetária baseada na âncora cambial e acompanhada de elevadas taxas internas de juros, a abertura comercial com a redução da proteção tarifária e não tarifária de amplos setores industriais, a redução do tamanho do Estado e a política agressiva de privatizações, a desregulamentação financeira abrindo o país à livre circulação do capital especulativo internacional, a eliminação de muitas das conquistas sociais dos trabalhadores, tudo isso está dentro de uma estratégia de modernização liberal, que segue rigorosamente as regras do Consenso de Washington e que em praticamente nada difere do modelo implementado em diversos países, especialmente latino-americanos: Chile, Argentina, México, Bolívia, Peru etc.

 Foi essa política, subordinada a tal estratégia, que afetou profundamente inúmeros setores da indústria local, tornando-os fortemente vulneráveis à concorrência de produtores de outros países.

 A indústria brasileira de produção de sapatos está entre os setores que foram atingidos. Sua competitividade se viu seriamente afetada: a redução da proteção e a valorização cambial fizeram com que os preços de produtos importados concorrentes se reduzissem consideravelmente. Sua capacidade de competição no mercado internacional também sofreu de maneira significativa. E tudo isso implicou a necessidade de enorme esforço para a redução de seus custos e de seus preços.

 Na mencionada reportagem jornalística não se explicita que, pelo menos em parte, nesse esforço de redução de custos, esteve presente a introdução de inovações técnicas. E isso seguramente ocorreu em maior ou menor medida, aumentando a produtividade do trabalho e resultando, pelo menos em termos relativos, em redução do nível de emprego [20].

 Para a redução de custos, então, apelam para a inovação tecnológica, com o consequente aumento da produtividade e, ao mesmo tempo, da intensidade de trabalho. É importante destacar que a elevação da produtividade do trabalho vem, normalmente, acompanhada de um incremento da intensidade do trabalho. São fenômenos que, em geral, apresentam-se simultaneamente [21]. Esta última, pelo fato de que implica uma maior exigência sobre o trabalhador, um maior esforço, significa maior grau de exploração do trabalho.

 Outro mecanismo utilizado pelo setor foi a relocalização das fábricas em outros estados da federação: abandono das regiões de salários mais elevados e busca daquelas onde a remuneração do trabalho é menor. Nessas regiões, particularmente no Nordeste brasileiro, parte considerável da reprodução da força de trabalho pode ser deixada à responsabilidade de relações não salariais. Em outras palavras, a sobrevivência da família é atendida por rendimentos provenientes de atividades que não as salariais e o salário aparece, muitas vezes, como complemento da renda familiar. Além disso, os salários podem ser muito baixos a) por menor exigência social e cultural de consumo, b) pois os níveis médios de exigências em saúde e educação são menores e a mortalidade (especialmente infantil) pode, sem conflitos, permanecer elevada e, c) também, porque a infra-estrutura da sociedade não exige gastos elevados em transporte, vivenda, saneamento básico etc. Note-se também que, nessas regiões, a capacidade organizativa dos trabalhadores é inferior e a quantidade de trabalhadores em busca de emprego assalariado é muito elevada (em outras palavras, enorme exército industrial de reserva sob a ''forma latente'' [22]).

 Assim, o capital -- com o objetivo de ampliar as necessárias filas de desempregados nas portas de seus departamentos de ''recursos humanos'' -- deixa a cômoda situação de aguardar, em seu próprio local de origem, a migração dos excedentes de população trabalhadora (ou exército industrial de reserva) para ir buscá-los onde eles se encontram. Inegavelmente o capital amplia sua mobilidade.

 Dessa maneira, é inegável que estamos diante de uma significativa elevação do grau de exploração da força de trabalho, seja pela intensificação do trabalho, seja pela superexploração, na medida em que se reduzem os salários a níveis inferiores ao necessário à normal reprodução dos trabalhadores [23].

 As empresas buscam não só os salários menores, mas também a renúncia fiscal praticada, muitas vezes, pela irresponsabilidade de governantes regionais [24]. Utilizam-se da guerra fiscal entre os estados e municípios para lograrem maiores benefícios. Observe-se que, sem nenhuma dúvida, a renúncia fiscal tem de implicar redução do salário indireto dos trabalhadores. A crise fiscal nos estados e municípios, fruto em certa medida das isenções e subsídios concedidos às empresas privadas, necessariamente, em última instância, se reflete na redução da qualidade de serviços prestados á população (especialmente saúde, educação, saneamento), que fazem parte do que se denomina salário indireto. A redução desse salário consiste em uma outra forma, nesse caso indireta, de elevação da superexploração.

 Portanto, a redução de custos, fruto da relocalização das fábricas, não resulta fundamentalmente de melhores condições de transporte, localização comercial, melhor infra-estrutura, maior disponibilidade de energia ou matérias-primas; é resultado, sim, em grande parte, do aumento da exploração e do incremento, direto e indireto, da superexploração dos trabalhadores.

 Por outro lado, a transferência de empresas (para regiões menos tradicionais na atividade industrial) provoca aumento do desemprego nas regiões de origem, onde normalmente os trabalhadores são mais organizados e sua capacidade de resistência à maior exploração é mais elevada. O crescimento do desemprego nessas regiões, que são mais articuladas e estruturadas industrialmente, favorece aquelas empresas e setores industriais menos flexíveis no que se refere a mudanças de localização de suas fábricas, ao lhes fornecer um maior exército industrial de reserva.

 O outro mecanismo de redução de custos, apontado pelos empresários produtores de sapatos, foi a renegociação com seus fornecedores, tendo como resultado a redução dos preços dos seus insumos. Muito bem; como estes fornecedores conseguem vender a preços mais baixos? Preocupados com a estratégia governamental de inserir a economia brasileira no processo de globalização, renunciam a parte apreciável de seus lucros? Muito mais provável é que procurem, para atender àquele objetivo, os mesmos mecanismos utilizados por seus clientes empresários: maior exploração e superexploração. Por certo, não é nenhuma novidade, para os empresários industriais mais modernos, que a terceirização seja excelente mecanismo de imposição de maior grau de exploração do trabalho, sem os inconvenientes da deterioração da imagem da grande empresa e dos grandes empresários.

 Apesar de tudo isso, os dirigentes das empresas produtoras de sapatos ainda reclamam que os salários na China e no Vietnã são excessivamente baixos, o que impediria competir. O que não fica suficientemente claro é se a referência ao assunto é só para justificar a busca que realizam de salários mais baixos e o grau de exploração que já alcançaram no Brasil, ou se pretendem ainda mais. Sugerem que na Itália, clandestinamente, enviam-se os materiais para serem confeccionados por trabalhadores tunisianos e vendem o resultado final como sapatos italianos; esquecem de dizer que nossa Tunísia está aqui dentro mesmo; é só procurar adequadamente a região e o estado.

 Dessa forma, a exploração do trabalho infantil, tal como denunciada em reportagem do jornal brasileiro, na moderna produção brasileira de sapatos, não é incompreensível; não é algo que sobreviva, por ainda não ter sido atingida pela política ''modernizadora'' dos governantes neoliberais; é, na verdade, resultado dela, fruto da abertura descontrolada da economia aos competidores internacionais. Ela é consequência da forma e do ritmo do processo de globalização que a estratégia neoliberal quer, e está conseguindo até agora, impor à economia brasileira.

 É verdade que os liberais cínicos, e mesmo os envergonhados [25], poderão argumentar, como vimos, que só com o tempo, com a longa exposição da indústria nacional à concorrência internacional, é possível -- depois de uma longa fase de transição, com desemprego, baixos salários,  miséria -- construir uma indústria moderna. Que esse é o preço que se deve pagar; que devemos ser pacientes, pois a modernização e o progresso estão submetidos a leis que exigem um longo transcurso de tempo. Que não adianta apressar-se, nem criticar; que isso é demagogia e populismo, que é (na infeliz linguagem principesca**) ''neobobismo'' e que isso só nos levará a situações piores; que não foram suficientes os quase dez anos de política neoliberal e que é necessário persistir e aprofundar as medidas, por mais impopulares que elas sejam.

 Para sorte nossa já sabemos que o neoliberalismo padece da síndrome da imunidade autoatribuída. Os que não acreditam na existência dessa síndrome e que pensam só acreditar nas evidências dos fatos ficam condenados a esperar outros dez anos para saberem se a exploração e a miséria desaparecerão ou continuarão frente aos nossos olhos como hoje. Só que devem sentir-se, desde já, incomodados com a possibilidade de serem obrigados, por sua própria concepção metodológica, a esperar outros dez, caindo assim no moto-perpétuo. Mas, que esses cínicos ou envergonhados não se preocupem tanto; talvez o neoliberalismo, como força hegemônica, não sobreviva durante nem mesmo alguns desses outros dez anos necessários. Aí estão a Inglaterra, a França, o México e outros mais a assinalar provavelmente a tendência de nosso tempo.

 O príncipe***, talvez por estar tão imbuído de sua realeza e talvez por considerar-se eleito por Deus para ser o salvador da Humanidade (pelo menos da brasileira do século XX e XXI) e tendo se tornado tão íntimo do neoliberalismo, deve estar sofrendo da mencionada síndrome. Quiçá a História lhe reserve uma surpresa.


Notas


[1] Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 9.7.1997.
[2] Idem.
[3] Dizer ''é a UNE contra o mundo'' é, obviamente, afirmar que, no mundo inteiro, só essa instituição atreve-se a se opor ao neoliberalismo, esquecendo-se das recentes derrotas eleitorais sofridas por essa concepção, pela ordem, na Inglaterra, na França, no México, em El Salvador, e das manifestações populares, cada vez mais frequentes, contra essa política em várias partes do mundo.
[4] Cf. RAMONET, Ignacio. O pensamento único. In: MALAGUTI, M. L. & CARCANHOLO, R. A. A quem pertence o amanhã?: ensaios sobre o neoliberalismo. São Paulo, Edições Loyola, 1997, pp. 23 a 25.
[5] Baseada nos famosos relatórios dos inspetores ingleses de fábrica, nos relatórios oficiais da ''Children's Employment Comission'' (1863 a 1876) e também em outras fontes.
[6] Passagem extraída de um dos relatórios de inspetores ingleses de fábrica e citada por MARX, K. O capital. São Paulo, Difel, 1987, l. 1, cap. VIII (A Jornada de Trabalho), pp. 273 e 274.
[7] Extraído por Marx do Daily Telegraph, de 17.1.1860. Em MARX, K. O capital, op. cit., pp. 275 e 276.
[8] Idem, p. 279, citando um relatório da ''Children's Employment Comission'' de 1863;
[9] Idem, p. 279.
[10] O neoliberal, em razão dessa síndrome, atua como aquele médico mal educado que, procurado por paciente com dor de cabeça insuportável, receitou-lhes goles sucessivos de água salgada, por um período de uma semana. Ao fim desse período, regressou o paciente com os mesmos sintomas. Recomendou-lhe o doutor elevar a dose da solução e, mais uma vez, o resultado esperado não foi alcançado. Depois de várias idas e vindas, sempre com elevações na dosagem recomendada, o médico continuava convencido dos benefícios de sua receita. Achando que o erro não era da sua medicina mas do paciente, respondeu mal-humoradamente a um telefonema de um familiar dizendo que o paciente deveria jogar-se no mar, embora não soubesse nadar. Posteriormente, informado de que o paciente morrera afogado, com uma certa preocupação, pensou com os seus botões: ''Nada disso. Ele não foi capaz de engolir a quantidade suficiente de água salgada e, por isso, morreu de dor de cabeça!''
[11] BENJAMIN, César. Sensatos e espertos: subintelectuais em ação (uma nota sobre Roberto Campos e Fernando Henrique Cardoso). In: Revista Atenção!, ano 2, nº 9. Rio de Janeiro, Scritta, 1996, pp. 34 a 37. O autor também afirma: ''As deficiências do projeto liberal conduzem os seus defensores à inevitável conclusão de que é preciso aprofundar esse mesmo projeto. A incapacidade de realizar-se é, simultaneamente, uma fraqueza do modelo, no plano da realidade, e uma fonte de seu vigor, no plano da ideologia, propiciando um moto-perpétuo que pode ultrapassar, de longe, a barreira do razoável (...)'' (idem, p. 37)
[12] Idem, p. 36. O autor de palavras tão pertinentes quase chega a dizer a seus conterrâneos: ''de ta fabula narratur''. Afirma, a propósito dos limites, além da fronteira do razoável, do projeto neoliberal: ''Nós ainda não chegamos a ela, mas vamos chegar'' (idem, p. 37).
[13] Idem, p. 36.
[14] Idem, pp. 36 e 37.
[15] Jornal do Brasil, de 7.7.1997.
[16] Isso porque espera-se que no ano 2001 o imposto de importação, que é de 36%, passe para 20%.
[17] Mencionadas na mesma reportagem do Jornal do Brasil, de 7.7.1997.
[18] Na verdade trata-se de um ''conceito'' ridículo. Dentro do que chamam de ''custo Brasil'', cabe de tudo, absolutamente tudo, desde que justifique a dificuldade do empresário local em competir no mercado internacional ou mesmo em contribuir para o desenvolvimento econômico do país. Obviamente que não inclui aquilo que é de responsabilidade dos empresários: sua voracidade, sua incapacidade empresarial e sua incompetência como organizadores. Esquece o fato de que o empresariado brasileiro sempre oi, desde suas origens, tributário do Estado. É um excelente ''conceito'' para servir na propaganda da perspectiva neoliberal. Dentro dele cabem: os custos derivados de deficiências em infraestrutura, encargos sociais sobre o pagamento de salários, a insuficiente educação e saúde para os setores trabalhadores, a ineficiência da máquina estatal, a legislação trabalhista, a previdência social etc.

''O salto de competitividade do setor privado depende ainda da conduta do governo nos campos da infraestrutura, portos, juros, tributos, previdência social, legislação trabalhista e, enfim, em tudo aquilo que determina esse verdadeiro Muro de Berlim que é o famigerado 'custo Brasil' '' (MORAIS, Antonio Ermirio de. ''Custo Brasil'': um gigantesco obstáculo. Folha de S. Paulo, de 18.5.1997)
 Esses verdadeiros teóricos da economia esquecem que, inexistindo um padrão, teríamos que falar do ''custo Estados Unidos'', ''custo Japão'', ''custo Alemanha'' etc. Além disso, se tivéssemos a liberdade de incluir no conceito os gastos derivados do nível salarial de cada país, seguramente o do Brasil seria bem menor que os mencionados e que muitos outros mais.
[19] Uma parte importante dos impostos destina-se não aos gastos do setor estatal resultantes ou não de sua estrutura ineficiente e nem mesmo aos gastos sociais, mas a transferência ao setor especulativo. Referimo-nos àqueles resultantes, justamente, do pagamento de juros da dívida pública. Assim, a reclamação dos empresários produtivos dirige-se, em grande parte, contra a remuneração do capital especulativo. Seria bom recordar que, pelo menos para os médios e grandes grupos empresariais, o capital produtivo e o especulativo, em medida considerável, estão nas mesmas mãos. O que perdem por um lado, ganham, até mais, pelo outro.

 Além disso, devemos recordar que as elevadas taxas de juro favorecem os exportadores, ao ser-lhes permitido a antecipação das receitas de suas vendas ao exterior.

Sobre o paraíso fiscal criado para o capital especulativo, em nosso país, pela globalização e pela política neoliberal, basta observar a edição do mesmo dia do Jornal do Brasil (7.7.1997). Ali, Flavia Sekles, correspondente em Washington, conta que Everett Santos, dirigente de grande fundo de investimento internacional, afirmou o seguinte: ''(...) eu vi o Brasil passar por muitas fases econômicas e sempre achei interessante como é possível ganhar dinheiro no Brasil até nos piores dos tempos. A atual fase pela qual o país passa pode não ser a melhor delas mas (...) a tendência é melhorar, na medida em que leis e regulamentações se tornam mais claras (...)'' (Puro eufemismo; ele gostaria de dizer, se fosse mais sincero, ''leis e regulamentações mais favoráveis'' - R. C.).
 Segundo a mesma jornalista, a projeção de lucro dos investimentos desse grande fundo, no Brasil, é de 20% ao ano! Isso significa que o valor do capital inicial mais do que duplica em quatro anos.
[20] É provável que não tenha havido menção a inovações, por tratar-se de uma reportagem que os empresários reclama de medidas que, propriamente, não estão ao seu alcance ou, pelo menos, que não dependem só deles: redução de salários, juros, impostos, taxas etc.
[21] A intensificação do trabalho normalmente não é mencionada, pois é confundida com o aumento da produtividade. Naquela, o incremento da utilidade produzida em um determinado espaço de tempo obtém-se graças a um esforço maior do trabalhador; na maior produtividade, o esforço de trabalho não se altera apesar do maior resultado. Normalmente, a introdução de modificações tecnológicas no processo produtivo tem como consequência tanto o aumento da produtividade quanto a intensificação do trabalho. Se desejássemos uma análise mais teórica, poderíamos dizer que, enquanto o aumento da produtividade do trabalho (quando não generalizada no setor e durante algum tempo) resulta em mais-valia extra (e, em última instância, em mais-valia relativa), a intensificação do trabalho significa elevação da mais-valia, na forma de mais-valia absoluta.
[22] MARX, K. O capital. São Paulo, Difel, 1987, l. 1, cap. XXIII (A lei geral da acumulação capitalista), pp. 745 e 746.
[23] O conceito de superexploração aparece pela primeira vez, e nesse sentido, em: MARINI, Ruy Mauro. Dialéctica de la dependencia. México, Ediciones Era, 1973 (Há uma edição portuguesa do mesmo livro: Dialéctica da Dependência. Coimbra, Centelha, 1976. Trad. de Jorge Reis).**
[24] ''Na busca de mão-de-obra barata e incentivos gerados pela guerra fiscal dos estados, o segmento calçadista realiza uma espécie de dança, entrando ou saindo das regiões conforme as vantagens oferecidas'', diz José Mitchell (articulista do Jornal do Brasil, edição de 7.7.1997, na mesma página). Isso, obviamente, só é possível pela existência de enormes contingentes de exército industrial de reserva na forma latente, em todas essas áreas.
[25] Cf. Carcanholo, R. Contra a ofensiva neolieberal, a hipocrisia e a impotência. In: MALAGUTI, M. L & CARCANHOLO, A quem pertence o amanhã: ensaios sobre o neoliberalismo. São Paulo, Edições Loyola, 1997.

*Passagem do texto da convocatória do Primeiro Encontro Intercontinental contra o Neoliberalismo e pela Humanidade (Chiapas, México, julho/agosto de 1996), escrito pelo subcomandante Marcos, do Exército Zapatista de Libertação Nacional. No original: ''Una nueva mentira se nos vende como historia. La mentira de la derrota de la esperanza, la mentira de la derrota de la dignidad, la mentira de la derrota de la humanidad''. Cf. La Jornada (México), de 30.1.1996.
**Referência ao apelido de FHC, ''príncipe dos sociólogos''.
***Para uma explicação pormenorizada do conceito, ver o artigo de Marcelo Carcanholo (filho do autor do artigo acima exposto), (Im)Precisões sobre a categoria superexploração da força de trabalho.






quarta-feira, 1 de abril de 2015

Thatcher: não havia alternativa


Artigo do economista marxista britânico Michael Roberts para seu blog, The Next Recession



 A era Thatcher durou de 1979 a  1990. Muito se fala do ''thatcherismo'' como algum tipo de força contrarrevolucionária a serviço do capital, largamente aclamada por seus apoiadores como salvadora da Grã-Bretanha para o capitalismo, ou ao menos de livrá-la do desastre. A verdade, porém, é que o thatcherismo foi apenas um fio de uma mudança geral na estratégia econômica forçada sobre o capital pela crise em que as principais economias capitalistas haviam entrada até o final da década de 1970. Essas economias tinham experimentado uma redução constante e acentuada da rentabilidade (taxa média de lucro) do capital a partir de meados dos anos 1960 em diante. Isso foi resultado da retração dos mercados de trabalho -- já não fornecidos com influxos de mão-de-obra barata de desempregados após a guerra ou uma rapidamente crescente população trabalhadora ''baby-boomer''. E também houve um aumento do nível de investimento em tecnologia em relação ao trabalho que  menos bem no aumento da produtividade do trabalho.

 De acordo com meus próprios cálculos, entre 1963 e 1975 a taxa média de lucro para a economia inteira do Reino Unido caiu de 28% a partir de cerca de 26% para 19%. A taxa de exploração [da força de trabalho i.e. taxa de mais-valia] caiu 20%, enquanto a composição orgânica do capital (a relação entre o custos de equipamento e tecnologia e os do trabalho) aumentou 20%. Esse foi um clássico período de crise para o capitalismo, explicado pela teoria econômica marxista. Veja meu livro, A Grande Recessão, para mais detalhes.







 Ocorreu o mesmo fenômeno nos Estados Unidos, no Japão e em muitas partes da Europa. Algo tinha de ser feito -- como a própria Thatcher disse: ''não há alternativa'' [There Is No Alternative -- TINA]. A única saída era destruir o poder do trabalho e mudar a distribuição do valor criado pelo trabalho para o capital, ou seja, aumentar a taxa de mais-valia como compensação para a queda na taxa de lucro. Além disso, em muitas das principais economias houve uma necessidade de destruir o valor de antigos capitais e indústrias. Eles seriam muito mais produtivos e rentáveis com novas tecnologias e com mão de obra mais barata em outros lugares. O objetivo era acabar com a produção de muitas indústrias pesadas e de transformação nas economias capitalistas maduras e transferi-las para aqueles como o Leste asiático e a China, onde a rentabilidade era muito maior (em outras palavras, a globalização).

 Essa estratégia requereu uma nova ideologia baseada nos assim chamados ''livres mercados'' e um rompimento com a ''economia mista'' de tipo keynesiano, onde os governos provinham algum nível de bem-estar e serviços públicos e ''intervinham'' na produção capitalista pelo ''bem comum''. Mas como Thatcher infamemente disse, ''não há sociedade''. Acima de tudo, acabar com o poder do trabalho, reduzir o custo do Estado por meio de privatizações e, no caso do Reino Unido e EUA, desenvolver uma economia baseado em serviços financeiros (rentista) eram as tarefas. Isso exigiu líderes com nervo e compromisso -- Thatcher foi uma, mas Reagan também o foi a seu próprio modo.

 Mas o que é frequentemente esquecido é que essa contrarrevolução para salvar as economias capitalistas maduras começou mais cedo que com Thatcher ou Reagan. A era neoliberal, ao menos para o Reino Unido, começou em meados dos anos 70. Os dados confirmam isso. A taxa de lucro do Reino Unido chegou ao fundo em 1975, durante a primeira recessão mundial simultânea de 1974-1975. O governo trabalhista sob PM Callaghan e a Chanceller Healey reagiram a esta crise que forçou o Reino Unido a pedir ajuda do FMI em 1976 iniciando a longa luta para reduzir os gastos do governo, espremer salários e reduzir a indústria. Como Callaghan pôs sem rodeios para à conferência trabalhista na época: ''Nós costumávamos pensar que você poderia atravessar o caminho para sair de uma recessão e aumentar o emprego cortando impostos e aumentando os gastos do governo. Digo-vos com toda a franqueza que esta opção não existe mais e que, até agora, uma vez que já existiu, só funcionou em cada ocasião desde a guerra injetando uma dose maior de inflação na economia, seguido por um nível maior de desemprego no próximo passo''. A economia keynesiana foi rejeitada primeiro pelo Partido Trabalhista e não por Thatcher.

 A terrível crise global de 1980-2 fez, ainda melhor do que Thatcher, o trabalho de aumentar o desemprego a novos níveis, reduzindo salários reais e fechando velhas e improdutivas (ou seja, não lucrativas) indústrias e instalações. Em 1982, a fabricação no Reino Unido foi dizimada. Thatcher meramente presidiu o colapso e, em seguida, deu continuidade ao processo durante o boom subsequente ao privatizar o que restou. Ela garantiu que isso acontecesse esmagando qualquer resistência do trabalho por meio da abolição do salário minimo e a introdução de uma legislação antissindical draconiana imposta por uma força policial cínica e corrupta. Essas transformações no mercado de trabalho, concluiu Thatcher, ''liberaram a gestão mais uma vez para gerenciar e assim garantiu que o investimento fosse novamente considerado como a primeira chamada para os lucros, ao invés da última''.

 Ao mesmo tempo, a desregulamentação dos serviços financeiros (que ficou conhecido como ''Big Bang'') mudou o foco da indústria para as finanças. Isso fez de Londres a capital financeira da Europa, senão do mundo, embora o setor bancário inglês fosse dizimado, uma vez que a maioria das principais instituições financeiras operando agora na cidade são norte-americanas ou europeias.

 Então, de 1975 a 1996 a taxa de lucro no Reino Unido subiu 50% e mesmo a composição orgânica do capital tendo subido 17% (especialmente nos anos 90), a taxa de exploração da força de trabalho aumentou 66%! Se isolarmos apenas os dias de Thatcher, é a mesma história: a taxa de lucro subiu 22%, tecnologia e instalações foram dizimadas (caindo a composição orgânica em 3%), mas a taxa de exploração aumentou 20%. Os anos Thatcher foram devastadores para o trabalho, mas o processo já havia começado sob os trabalhistas e continuou até meados de 1990.

 Há dois mitos que os apoiadores do capitalismo gostam de proclamar sobre os anos de Thatcher. O primeiro é que o crescimento foi muito melhor sob sua gestão que antes ou depois e permitiu ao Reino Unido competir com outras economias capitalistas. Mesmo Paul Krugman parece aceitar isso em seu último post: ''Eu penso que é um fato que as alterações de Thatcher nos impostos, regulação do trabalho etc. criaram uma economia mais flexível, que tornou os bons anos sob Blair possíveis''. Bem, é verdade que entre 1982 e 1997 o Reino Unido teve um crescimento real do PIB melhor que entre 1965 e 1982, quando a taxa média de lucro estava despencando. Mas o crescimento econômico (e a rentabilidade) estava longe de ser tão alto quanto entre 1946 e 1965, no Reino Unido e em todas as economias capitalistas avançadas.

 A ''Era de Ouro'' para o capitalismo foi na década de 1960 e não na de 1980 -- e a Era de Ouro também foi quando as taxas de imposto de renda progressivas estavam operando (uma taxa máxima de 99% nos Estados Unidos sob Eisenhower em fins da década de 1950); havia bolsas de estudo no Reino Unido para o ensino superior (sem taxas e empréstimos); as pensões foram equiparadas aos salários médios; setores importantes da economia, como água e energia, estavam sob o controle do Estado (incluindo o Banco da Inglaterra) e o desemprego era relativamente baixo. Os anos Thatcher não alcançaram tais conquistas de forma alguma.




 Na verdade, se não fosse por um golpe de sorte, a descoberta e aproveitamento de petróleo do Mar do Norte e do gás no final de 1970, a economia do Reino Unido teria se saído muito pior e não teria feito melhor que na década de 1970.  Foi uma pequena janela de boom do petróleo que permitiu ao Reino Unido competir com aqueles como EUA e Alemanha. Mais uma vez isso começou antes de Thatcher, mas o governo dela foi o que mais se beneficiou já que os preços do petróleo aumentaram fortemente até 1986. Houve um crescimento insignificante da produção industrial entre 1973 e 1993. E, claro, a indústria de energia elevada de capital intensivo, criou poucos empregos, apenas grandes lucros. O setor primário como um todo foi responsável por 4,3% do PIB em 1973. O crescimento na extração do petróleo no Mar do Norte na década de 1980 resultou em um aumento de 6,7%.



 

  Outro mito é o controle dos gastos públicos. Nesses dias de ''austeridade'', é irônico que a era Thatcher na verdade não tenha visto muito de uma redução de uma redução nos gastos do governo ou da tributação, ao menos em relação ao PIB. Na verdade, este fato é lamentado por estrategistas da direita hoje. Como mostra a tabela abaixo, os impostos como proporção do produto interno bruto na Grã-Bretana de fato aumentaram acentuadamente durante os sete primeiros anos da Sra. Thatcher no poder, antes de caírem em seus últimos anos. Mesmo no final eles eram significativamente maiores do que quando ela assumiu o cargo. Os gastos também aumentaram durante seus primeiros sete anos antes de cair em seus últimos. Redução da carga fiscal, o mantra do atual governo, nunca foi aplicada sob Thatcher.





 Embora o governo Thatcher tenha cortado a taxa de imposto de renda pessoal superior de 83% para 60% imediatamente após ocupar o gabinete, a alíquota do imposto de base só foi reduzida de 33% para 30%. E em 1980, a taxa básica de tributação de 25% foi eliminada, de forma que 30% tornou-se a taxa de imposto mais baixa. E a sra. Thatcher pagou por seu corte de impostos em 1979 praticamente dobrando o IVA de 8 para 15%. Como um comentador de direita pôs, ''o efeito do programa Thatcher tem sido um aumento substancial na tributação sobre praticamente todos os contribuintes''.

 O resultado real da redução das taxas de imposto de renda para pessoas com renda superior e abolição de impostos sobre ganhos de capital, redução da tributação sobre patrimônio mas aumento dos impostos sobre o consumo foi o aumento das desigualdades de renda e riqueza. Mas a principal razão para o aumento da pobreza e os níveis elevados de desigualdade agora, apenas acompanhados pelos dos EUA, foi a dizimação de empregos seguros bem-pagos na indústria e na sua substituição por empregos inseguros e de baixa remuneração no setor de serviços. E claro, houve o aumento maciço de dos rendimentos e da riqueza para a elite no setor de serviços financeiros. E todos nós sabemos como isso terminou em lágrimas.

 Thatcher fez seu trabalho destruindo milhões de empregos britânicos, rendas e vidas com entusiasmo, dedicação e arrogância. Mas, nos interesses do capitalismo, não há alternativa.




*Alguns dados adicionais sobre a gestão Thatcher:

''Nos dois primeiros anos do novo governo, os impostos aumentaram, os salários reais caíram e o PIB reduziu-se em 3,5%. O que é pior, a produção manufatureira caiu em 14% no mesmo período e a taxa de emprego caiu na mesma proporção... Depois da queda inicial, a recuperação foi lenta, especialmente na indústria manufatureira. A produção não alcançou os níveis daquela de 1979 até 1987 e a taxa de emprego continuou a cair. A taxa de desemprego geral cresceu, de cerca de 4% para mais de 10%, e continuou em tal nível até 1987-1988, quando começou a declinar lentamente.'' (Humprey, in: Soares, R. M. (org.). Gestão da empresa, automação e competitividade. Brasília, IPEA/IPLAN, 1990 [p.216]. 

 Margaret Thatcher nunca ganhou mais que 40% dos votos em qualquer eleição e a maioria dos eleitores votaram contra ela em todas as eleições.